sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Fraternidade e Saúde Pública


Desde 1964 a Igreja Católica realizada a Campanha da Fraternidade. Opção pastoral que nasceu impulsionada pela força inovadora do Concílio Vaticano II e o anseio da Igreja sufocada pelo mofo tridentino preso às paredes da uma Igreja de hábitos medievais que se abre para mundo: Gaudium et Spes, com a promoção humana integral e a pastoral social.

A partir de então amplia seus horizontes de fé e encarna na vida dos crentes o convite quaresmal à necessária e urgente conversão, apontando e colocando o dedo nas feridas sociais e responsáveis pelos estertores e sinais de morte que o mundo pós-moderno enfrenta nos dias atuais. Mais que isso, em sua pedagogia do “ver, julgar e agir”, arrisca a lançar propostas concretas de ações transformadoras em favor da vida, transformando-se em sinal de lucidez e coerência em meio a tantos devaneios e corrupção no trato da coisa pública.

O tema deste ano é a Saúde Pública “aspiração de todos e desafio da sociedade”. Nada mais apropriado. Isso porque a pergunta que todos ouvimos, pelo menos uma vez ao dia é: “-- Como vai? -- Como está de saúde?”. E todos desejam “—Saúde”. Isso porque esse é o desejo mais frequente de todos. Não raro acrescentamos em nossos diálogos: “-- o importante é ter saúde. O resto se dá um jeito”.

Aproprio-me da reflexão do Pe. Antônio Valentini Neto, Pároco da Catedral São José, de Erexim, num texto que me foi enviado pelo Pe. Alex José Kloppenburg, lá do Rio Grande do Sul. Nada mais oportuno, devido a riqueza de informações que tento aqui, modestamente, resumir neste artigo dirigido não á teólogos e párocos, mas ao grande público que sente na carne o rigor das filas em busca de saúde que parte, nem sempre, das mãos dos médicos.

A doença sempre perturba e cria ansiedade. A doença também compromete o patrimônio da pessoa e da família. Mesmo com os grandes avanços nos recursos clínicos e a melhoria dos serviços sociais é grande o número de pessoas que não têm acesso à assistência de Saúde Pública condizente com as necessidades e dignidade. Por isso, a Campanha da Fraternidade, em sua 49ª edição, em 2012, trata da Saúde Pública, com o lema: “Que a Saúde se difunda sobre a Terra”, inspirado no versículo extraído do livro sapiencial Eclesiástico 38,8b (toda medicina provém de Deus).

No encontro das famílias, nos círculos bíblicos, reuniões, celebrações e catequese, o tema será refletido suscitando o espírito fraterno e comunitário das pessoas para que tenham maior atenção aos enfermos, suscitando mobilização por melhorias no sistema público de saúde. Tem, portanto, aspecto transformador, como não poderia ser diferente, por se tratar de ação-missão evangelizadora.

A Campanha também quer propagar o conceito de bem viver, motivando para hábitos de vida saudável; estimular a todos para o serviço aos enfermos com integração comunitária; ressaltar a importância da Pastoral da Saúde em todas as comunidades; divulgar dados sobre a real situação da saúde pública no Brasil, promovendo a defesa do SUS e a reivindicação de seu justo financiamento; habilitar as comunidades a acompanhar as ações da gestão pública, exigindo transparência na aplicação dos recursos, especialmente na saúde.

Alguém mais cético e menos atento aos avanços da fé engajada de algumas religiões nos tempos atuais poderá se perguntar o que Deus tem a ver com isso -- a saúde pública --, uma vez que o Estado é laico e fé e política devem viver separadas.

Falaríamos um dia sobre o tema. Mas aqui importa registrar que, inicialmente, todos querem viver e com saúde. Independente de credo, conta bancária ou etnia. As enfermidades e a morte contrariam esta aspiração universal e levantam interrogações existenciais nem sempre respondidas. Aspirações que o senso comum canaliza sempre para o ente chamado Deus. A ciência, com seus avanços permanentes, não obstante, amarga sua limitação diante de certas doenças e do fim do ciclo da vida neste mundo.

Ademais, a saúde nem sempre é compreendida em sua abrangência total. Muitos excluem a dimensão espiritual ao definir dicotomicamente saúde e doença. A Organização Mundial da Saúde (OMS), em 1946, definiu a saúde sem este aspecto fundamental: “um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não apenas a ausência de doenças”. Em 2003, a própria OMS acrescentou este elemento a esta sua definição de saúde. Já o Guia para a Pastoral da Saúde (GPS), elaborado pelo Conselho Episcopal Latino-americano (CELAM) define a saúde como: processo harmonioso de bem-estar físico, psíquico, social e espiritual, e não apenas a ausência de doença, processo que capacita o ser humano a cumprir uma missão que Deus lhe destinou, de acordo com a etapa e a condição de vida em que se encontre”.

Observe que a visão de homem (humanidade), cada vez mais torna-se complexa e paradoxalmente simples. Somo integralidade. Este conceito revela a compreensão do ser humano como uma unidade pneumossomática, termo originado da união das palavras gregas que significam espírito e corpo. Nesta compreensão, vida saudável requer harmonia entre corpo e espírito, pessoa e meio ambiente, personalidade e responsabilidade. Por isso “deus” e “Deus” intrometem-se na vida dos homens motivando-os a falar e refletir sobre “saúde”.

O assunto, não é de hoje que a Doutrina Social da Igreja vem tornando-o presente entre seus fiéis. Em 1981, o tema da Campanha da Fraternidade foi “Saúde e Fraternidade”, com o lema: “Saúde para todos”. Em 1984, tratou da vida, com o lema: “Para que todos tenham vida”.

Registre-se no campo prático, que a Igreja marcou e marca presença altamente significativa no campo da saúde, com creches, hospitais e similares. Diversas pastorais atuam diretamente para que as pessoas tenham mais vida saudável: Pastoral da Criança, Pastoral da Saúde, das Doenças Sexualmente Transmissíveis/Aids (DST/AIDS), da Pessoa Idosa, do Menor, dos Moradores de Rua e outras do grupo das Pastorais Sociais. Diversas outras Campanhas contemplaram temas específicos ligados a praticamente todas elas.

A Campanha da Fraternidade de 2012, que em outros anos teve o mérito de ostentar o caráter ecumênico é uma excelente oportunidade para os cristãos abrir as portas de suas casas e do coração para refletir e mobilizar-se em favor de um rol de questões (informações e reivindicações) que envolvem a “saúde” e o bem estar do homem na face da terra. E isso, porque diz respeito a todos, pode ensinar que Saúde é um direito de todos e não mero objeto de lucrativo negócio, da indústria farmacêutica e da máfia médico-hospitalar. É algo que tem a ver coma dignidade humana.

(*) Advogado e Diácono Permanente na Diocese de Três Lagoas-MS.
Mais informações sobre a CF 2012 acesse: http://www.portalkairos.net/campanhadafraternidade/default2012.asp
Publicado na Festa de Reis de 2012

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sábado, 26 de novembro de 2011

A boa nota dissonante do STF

Por Carlos Alberto dos Santos Dutra (*)

A declaração do presidente da mais alta corte do país, Antonio César Peluso, “O Supremo Tribunal Federal (STF) não é uma orquestra em que todos tocam em harmonia”, revela o que muitos brasileiros há muito temiam. Isso, porque a declaração dada em 9 de novembro de 2011 encerra um cadinho da natureza e origem nos homens que formam aquela instância máxima de decisão. Todos nasceram no chão da família brasileira. Embora eles se encontrem hoje no topo da pirâmide da Justiça do país, ontem eles ainda corriam pelas ruas do interior de Bragança Paulista-SP, Própria-SE, Tatuí-SP, Diamantino-MT, Paracatu-MG, Montes Claros-MG, Marília-SP, só para citar as cidades de origem de alguns ministros do STF.

O julgamento envolvendo a aplicação da Lei da Ficha Limpa, sem dúvida, não poderia ser o melhor mote. Segundo o presidente Antonio Peluso, “o colegiado não é uma orquestra em que todos tenham que tocar em harmonia (...). Pode ser que para a platéia determinados sons sejam dissonantes”. E devem ser mesmo. Segundo o portal JusBrasil/Valor Econômico, essa foi a terceira vez que o STF não conseguiu decidir a questão. A primeira foi em setembro de 2010, quando o julgamento envolveu Joaquim Roriz (PSC), então candidato ao governo do Distrito Federal. A segunda ocorreu em outubro do ano passado num recurso de Jáder Barbalho (PMDB), candidato ao Senado pelo Pará. E, agora, houve novo empate num outro recurso de Jáder. Em todas essas ocasiões, o placar foi de cinco votos a favor da aplicação da lei e de cinco contrários.

Por trás dos bastidores o que se observa -- no caso do recurso de Jáder Barbalho -- é que o assunto ficará a cargo da nova ministra do STF, Rosa Maria Weber Candiota, gaúcha indicada para o cargo pela presidente Dilma Rousseff, mas ainda não foi aprovada pelo Senado. Os demais casos, segundo o ministro Março Aurélio Mello, o impasse se deve à demora na indicação de ministros para o STF. Como é o caso do atraso no preenchimento da 11ª cadeira desse plenário, antes mesmo de a sessão terminar e o novo empate se confirmar, disse.

É bom lembrar que o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva deixou o STF por seis meses sem o 11º ministro, adverte o ministro Mello. A indicação de Luiz Fux foi feita pela presidente Dilma, em janeiro. Mas, Dilma demorou três meses para indicar a substituta de Ellen Gracie, que se aposentou em agosto. A indicação de Rosa Maria só foi feita no começa dessa semana. Às 16h45, os ministros começaram a julgar uma ação da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) que pede que a Lei da Ficha Limpa seja aplicada para as eleições de 2012. O relator indicado para o processo foi o ministro Luiz Fux.

Na caso Lei Ficha Limpa, não é de hoje o imbróglio. No mês de março, o povo brasileiro já havia se indignado diante do voto do ministro do STF, Luiz Fux. Ele era a grande a esperança do povo ver definitivamente aprovada a Lei da Ficha Limpa. Após o seu voto, o que se seguiu foi uma grande decepção. E não adiantou o ministro ir para os jornais, com o dinheiro do povo, dizer que não aceitava ser responsabilizado pelo voto que anulou a aplicação da Lei da Ficha Limpa nas eleições de 2010 (FSP, 29/03). Á época escrevi que não adiantava o ministro usar de poesia para dizer que debaixo da toga de juiz também bate um coração. “Política” escreveu sabiamente Goethe, “nunca pode provocar poesia”!

Perdida àquela batalha, hoje, retorna à arena a Lei da Ficha Limpa para decidir se ela valerá para 2012. Oxalá os ministros togados não repitam a sentença anterior que devolveu cargos à criminosos condenados em primeira instância com uma simples canetada. Bem escreveu o Prof. Laércio Jurandir Bruni que “ignorância que não é exclusividade de analfabetos”. Temos aqui a mais alta casta de doutores, conhecedores das leis e aplicadores esmerados da norma, porém pouco conhecedores do peso, da procedência e do fundamento dessas leis, porque desvinculadas da ética e dos princípios e valores das sociedades civilizadas.

Depois de ter classificado a Lei da Ficha Limpa como "um dos mais belos espetáculos democráticos (...) e instrumento de purificação do mundo político", o ministro Fux estreou no STF contrariando a expectativa que ele próprio nos fez criar dele. No primeiro julgamento da Lei da Ficha Limpa ele apegou-se ao artigo 16 da Constituição e desprezou o artigo 14, que prega a moralidade na vida pública, preferindo, aético, beneficiar a banda suja da política que nos governa. Não é de temer o voto de um homem deste?

Não é de hoje que a política anda tão desacreditada. Desde a pequenina câmara de vereadores da menor cidade do Brasil, que é Borá-SP, com 805 habitantes (IBGE, 2010) até o mais alto fórum legislativo e judiciário do Brasil, todos estão suscetíveis aquilo que 1.400 anos antes de Cristo Lao-Tséu já havia observado: "Quanto mais requintada é a legislação e a censura, maior número de assaltantes aparece". O que para o historiador Tácido que viveu por volta do ano 100 dC poderia ser sintetizado da seguinte forma: "O mais corrupto dos estados é precisamente aquele que tem o maior número de leis e o maior volume de poderes". À nova ministra caberá a tarefa de demonstrar o contrário.

(*) é mestre em História e pesquisador da UFMS.

domingo, 5 de junho de 2011

Um grito ecológico no meio da noite

Até quando ficaremos indiferentes?
Prof. Carlos Alberto dos Santos Dutra

Ela pesa uns 200 quilos e ainda está amamentando. Precisa ganhar o terreno alagadiço da margem direita do rio Paraná para chegar em casa. De onde está pode ver as luzes da cidade e os faróis dos carros cruzando rápido a sua frente. A noite está fria e ela tem de atravessar logo a pista, pois o ninho com o filhote, vigiado pelo macho, se encontra na outra margem da Reserva Cisalpina.

Desde que construíram aquela estrada sua vida não teve mais sossego. Com a inauguração da ponte ligando os Estados de Mato Grosso do Sul e São Paulo, o trânsito virou um inferno. Quando a pista era de chão batido, o número de carros era menor e depois da última balsa, as 10 horas da noite, o varjão virava um paraíso. Podiam passear livres, deitar na areia quentinha e dormir na maior tranquilidade. Dividiam o espaço com todos: sucuris, capivaras, catetos, até o veadinho pantaneiro vinha aquecer-se no meio da bicharada.

Mas a velha anta sapateira tem urgência de chegar em casa. De longe ouve a bulha do esturro da onça e não pretende virar jantar de ninguém. Olha para um lado, olha para outro. E, ao contrário do que dizem os homens, não é “tapada” não. Coloca a pata ungulada no asfalto e o silêncio é total, o que lhe enche de confiança. Afinal, a exceção de duas curvas, desde o Posto Fiscal João André, a BR 158 é uma grande reta e, aparentemente, oferece segurança.

Mas, a velocidade de 60 km por hora, solicitada pelo Instituto Cisalpina, Econg e Apoena ao DNIT, quem diz que as placas indicam isso? Quanto mais ser obedecida essa velocidade pelos motoristas apressados em ganhar distância para seus negócios. Os túneis para passagem sob a pista são escassos e as telas de proteção não existem.

O cenário estava completo. As luzes surgiram, como que do nada, e logo ofuscaram os olhos da fêmea, deixando-a praticamente cega. Uma motocicleta, depois outra, e depois um carro, não se sabe direito, a acolheram em cheio. Com a batida, ela foi arremessada, de volta, para o mato. As vitimas humanas ficaram espalhadas pelo chão enquanto outros motoristas chegavam para socorrê-los. Não muito longe dali, ouvia-se o gemido da tapirus terrestre, ameaçada de extinção, como que, também, pedindo socorro. Quem esteve no local disse que “foi muito triste”.

As vítimas, com ferimentos leves foram levadas ao hospital de Brasilândia. As luzes foram sumindo nos 20 km da Rodovia Luigi Cantone em direção à cidade. Na margem da pista, uma leve marca de freada. A pista agora está vazia. Por entre as folhas, adentrando a mata, um rasto de sangue revela o corpo mamãe-anta nos últimos estertores. Naquela noite pai e filho tapir esperaram em vão.

É véspera do dia 5 de junho de 2011, data dedicada ao Meio Ambiente. A noite recolhe-se no silêncio costumeiro da várzea do Paranazão, só despertado por algum outro veículo que volta a cruzar célere em direção a Paulicéia e vice-versa. Os vidros fechados, devido ao frio, não permitem aos motoristas ouvir o grito de socorro de uma natureza que mais uma vez clama contra a indiferença dos homens a sua volta... Até quando?

Fonte: http://institutocisalpina.vilabol.uol.com.br

sábado, 2 de abril de 2011

Ao amigo Berlange: ab imo pectore

Carlos Alberto dos Santos Dutra

Foi publicada no Diário da Justiça do dia 1º de abril de 2011, a notícia da concessão de aposentadoria voluntária do juiz José Berlange Andrade, titular da Comarca de Terenos desde março de 2001. Berlange, como é conhecido, é uma dessas pessoas que por onde passa, deixa a sua marca. Não a marca em monumentos, prédios ou placas com seu nome inscrito. Deixa a marca na alma e coração das pessoas, por sua honestidade e franqueza. Também porque mexe com o que de mais sagrado possuímos: a liberdade. Liberdade que pode ser decidia num piscar de olhos, pela letra fria da lei, pelo gesto insensível dos que vivem e nos olham do alto de suas togas.

Com Berlange sempre foi o contrário. Mesmo galgando a condição invejada por muitos, de juiz, permaneceu um homem do povo. Pessoa simples, querido e respeitado pela comunidade, deita suas origens numa família humilde, de Porto Velho (RO), tendo ingressado na magistratura sul-mato-grossense em 1992, como quarto colocado em concurso público. Mérito que o estimulou “a prosseguir alimentando e trabalhando para realizar os sonhos de um menino pobre, excluído, que quer mais do que estar entre os incluídos. Quer incluir a todos que não tiveram oportunidade concreta de desenvolver suas potencialidades humanas, até quanto possa”, escreveu ele, em 2002, prefaciando minha obra “As ocupações de terra e a produção do direito”.

Sua passagem por Brasilândia também deixou marcas indeléveis. Promovido por antiguidade, chegou à comarca em junho de 1994, permanecendo entre nós durante sete anos, até março de 2001, quando foi removido para Terenos, para tornar-se titular daquela comarca. Atuou ainda em Aquidauana e Porto Murtinho.

A juíza Sandra Artioli, da 5ª Vara dos Juizados Especiais da Capital, tem razão: Berlange é uma pessoa ímpar. “Sempre coerente em seus princípios, ele é um humanista em suas decisões e em sua conduta como magistrado. Ele não é só técnico. É um colega leal e solidário”, disse ela em notícia veiculada no site do TJMS.

Pessoa engajada, tanto no campo político como na ceara das artes, aqui entre nós, recebeu o título de cidadão brasilandense e sempre participou de eventos sociais e culturais, dando sua parcela de contribuição na lucidez e na oratória que lhe eram peculiares.

Na comarca de Terenos foi motivo de reportagem em rede de televisão mostrando a dedicação e preocupação de um juiz com o direito como prática da justiça. Na condição de vereador, à época, eu tive a oportunidade de propor na câmara municipal local uma moção de congratulações a este juiz que saiu do pedestal e das pompas forenses para declinar o ouvido e auscultar a voz e os anseios do povo.

Após receber nossas homenagens fez questão de responder-me. Suas palavras configuram-se em verdadeira cartilha, revelam o modus operandi da inclusão e da solidariedade, promovida pelo homem e seus ideais altruístas: “Carlito, índio guerreiro. Isso que a TV mostrou representa uma parte do trabalho que realizo em favor de uma justiça comunitária, uma prática que leva o juiz para perto do povo, principalmente para reduzir o nível de exclusão, muito elevado no ambiente campesino por causa da ausência do Estado e da carência dos serviços públicos que isto acarreta.

Duas ou três vezes por semestre visito núcleos de concentração estabelecidos no campo (colonizações e assentamentos rurais), distantes, isolados, com dezenas e centenas de famílias abandonadas à própria sorte (sem escolas, sem assistência médica e sem policiamento, com problemas de água, de luz e de comunicação, inclusive sem telefonia).

Quando nos deslocamos não vamos sozinhos, porque não se trata de levar apenas meios de produzir decisão jurisdicional que resolva conflitos (preferencialmente pela via consensual), mas nos acompanham membros do governo federal (INCRA), estadual (estradas, policiamento, etc.), do município saúde, educação,, etc.), e até das empresas privadas que prestam serviços públicos (ENERSUL, TELECOM, etc.). Fazemos uma grande e multifuncional audiência pública. Começa pela manhã (9:00) e termina ao final da tarde (17-18:00). Meu querido índio velho, nesta prática tem um pouco de tua influência guerreira, de tua luz espiritual. Você e sua família moram no meu coração. Abraços. Berlange”.

É, com ele era sempre assim. Do fundo do meu coração, não me resta outra coisa senão dedicar-lhe os versos de Thiago de Mello: “como seu pouco e sou pouco, faço o pouco que me cabe, me dando por inteiro”. Sonhador como poucos, mas mantendo-se firme, pé no chão, sempre na condição de defensor do direito e da justiça. Oxalá os demais magistrados se espelhem neste guerreiro que hoje se aposenta e deixa a todos saudade.

quinta-feira, 31 de março de 2011

Um relato completo do caso "Rigo"

Mato Grosso do Sul: “CORRUPÇÃO MATA” o cidadão de vergonha
Cedampo (repassando)

UM RELATO COMPLETO DO CASO “RIGO”

Declarações do Dep Ary Rigo sobre corrupção, com a distribuição de R$ 6 milhões mensais - entre os Deputados Estaduais (R$ 120 mil para cada um) Ministério Público (R$ 300 mil), Tribunal de Justiça (R$900 mil) e Governadoria (R$ 2 milhões).

Por se tratar de fatos ligados aos Poderes estaduais, a competência para sua apuração é dos Órgãos estaduais: Ministério Público Estadual, Polícia Estadual, a própria Assembléia e o TJ. Todos já sabiam que essa apuração não ia dar em nada, como não deu, porque todos os Órgãos estaduais estão diretamente envolvidos no escândalo. Assim:

1) O TJMS abriu um processo disciplinar e indagou da AL quais as informações e os indícios de repasse indevido de dinheiro (R$ 900 mil/mês) para Desembargadores; como a AL informou não ter nenhuma informação, o processo foi arquivado;

2) a AL, por sua vez, abriu um procedimento interno para apurar as denúncias, presidida pelo Dep. Picarelli, e também concluiu não haver nenhum indício para se prosseguir nas investigações e arquivou o processo;

3) o MPE também abriu um processo para apurar as denúncias, principalmente em relação do anterior Procurador Chefe, dr Miguel, e até agora nada concluiu.

Já nos primeiros dias que se seguiram à divulgação do vídeo do DEP RIGO, as entidades civis, diante da indignação popular, reuniram-se no início de outubro/2010, à frente FETEMS, SINDJUS, MOV. POPULARES, CENTRAIS SINDICAIS, e foram para a porta da AL, ensaiando um movimento popular nas ruas pela apuração rigorosa dos fatos.
Mas, dias depois, a OAB propôs a criação de um FORUM PELA ÉTICA contando principalmente com os CONSELHOS PROFISSIONAIS (MEDICINA, FARMÁRCIA, ENGENHARIA, ETC), além da ACRISUL, FIEMS, ASSOCIAÇÃO COMERCIAL e outros.

Resolveu-se, então, fundir os dois fóruns criados, sob o comando da OAB, criando uma palavra de ordem comum e uma agenda principal também comum (PALAVRA DE ORDEM: CORRUPÇÃO MATA ! Vide site OAB/MS - FORUM ).

Resolveu-se, então, por sugestão da OAB, apelar a Brasilia para garantir a apuração dos fatos, via da esfera FEDERAL (Polícia Federal e MP Federal). Bateu-se às portas do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) e do CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público), cujos Corregedores (Ministra ELIANA CALMON e Min. GURGEL) estiveram aqui. A Min ELIANA CALMON recebeu as entidades e populares em audiência pública no plenário do TJMS, acatando denúncias contra o PJ local.

Ocorre que o CNJ só tem competência para investigar administrativamente os JUIZES e DESEMBARGADORES e o CNMP, por sua vez, só pode investigar os PROMOTORES DE JUSTIÇA. Tanto um como outro, não tem poderes para obrigar a AL, que é outro Poder, a entregar os documentos que possam incriminar Juízes e Promotores.

Esperava-se, todavia, a boa vontade e o espírito público tanto dos componentes da AL, como do TJMS e do MPE para a apuração dos fatos e a punição dos culpados, diante de tamanha iniqüidade. A Ministra ELIANA CALMON e o Procurador Geral da República, Dr GURGEL, saíram daqui confiantes de que teriam acesso aos documentos da AL, especialmente de um, que é fundamental para desvendar as denúncias: a conta bancária da AL, especialmente, a do HSBC.

Todo mundo sabe, até as pedras desta cidade, que, desde muito tempo, a AL faz todas essas operações através de cheques do HSBC (principalmente) diretamente aos “beneficiários” do esquema do mensalão guaicuru, sem nenhum “recibo”, sem “nota”, sem “empenho”, sem nada ! Na mão grande mesmo, com a absoluta conivência dos demais Poderes, principalmente do valoroso TJMS.

Há muito tempo, muita gente já tentou ter acesso a essa conta, que de resto, deve ser franqueada ao público, segundo determina a Lei de Responsabilidade Fiscal e a própria Constituição Federal. Todavia, a AL não fornece os dados e o TJMS, vergonhosamente, não obriga a ASSEMBLÉIA a abrir suas contas. Só o jornal O ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL impetrou três mandados de segurança para isso e não obteve êxito.

POIS BEM: toda a expectativa que a sociedade sul-matogrossense, a Ministra CALMON, o Procurador GURGEL tinham de que o MP e AL iriam colaborar para a elucidação dos fatos acabou agora: depois de quase três meses, em que o MP fingia cobrar duro da AL a remessa do único documento que interessa, que é a conta bancária, a ASSEMBLÉIA resolveu entrar com um mandado de segurança no TJMS pedindo para que o Poder Judiciário lhe autorizasse a não apresentar os documentos “requisitados” pelo MPE !

Mas o pior não foi o pedido – que aliás já era esperado – mas o resultado: o glorioso TJMS concedeu a medida, dizendo que a AL realmente não tem que apresentar os documentos solicitados pelo MPE. Que tal ? Para o TJMS o Poder Público tem o direito “constitucional” de manter em sigilo suas contas e despesas !!! No mundo atual, certamente o Kadhafi e alguns outros “monarcas” tem direito igual...

Sem esses documentos, acabou-se apuração, e tudo volta ao normal, e a “denúncia” do Dep. Rigo não passou de uma “ressaca” mal curada ..., conforme concluiu a “comissão” presidida pelo Dep. Picarelli.

É por isso que a reunião de QUINTA FEIRA AS 14horas no MINISTÉRIO PUBLICO ESTADUAL é da maior importância: trata-se de concordar com que a “corrupção mais deslavada” tome conta de vez do Estado ou a sociedade, indignada, deve ir para as ruas, às últimas conseqüências, e passar o Estado a limpo, varrendo dos três poderes os corruptos que infestam a administração pública do MS .

INFORMAÇÕES:

ADVOGADOS: CARMELINO REZENDE 9981 3427
MARCELO BARBOSA 9982 7580
DIONIZIO GOMES 9912 6375 SINDJUS MS

Prof. Jânio Batista de Macedo, Presidente Estadual do SINDINAPI - MS., Sindicato Nacional dos Aposentados Pensionistas e Idosos da FORÇA SINDICAL., Sub Sede Mato Grosso do Sul., Av. Orlando Daros 279 Parque Resd. Maria Aparecida Pedrossian, 79044490 Campo Grande MS., www.sindicatodosaposentados.org.br, Fone: (67) 3344 2165 Cel. (67) 8145 2519

terça-feira, 1 de março de 2011

A profissão de leiteiro morreu. Viva o leiteiro!

Carlos Alberto dos Santos Dutra (*)

Dias atrás, um conhecido e popular morador de nossa cidade que vende leite de forma artesanal foi autuado pela fiscalização sanitária e teve o produto apreendido. O ocorrido não deixa de ser novidade na maioria das cidades do Estado de Mato Grosso do Sul, acostumada aos laços frouxos da lei e do compadrio.

Esse tipo de ação, sobretudo nos pequenos municípios, em boa hora os coloca nos trilhos do desenvolvimento e do chamado progresso. Por um lado, representa uma tomada consciência dos órgãos públicos em fazer cumprir uma lei que existe há mais de 40 anos e que nunca foi colocada em prática por estas paragens, o que desacostumou o povo de seus direitos e deveres.

Por outro lado, essa realidade não deixa de ser um desafio para as administrações municipais em razão do desconforto político que tal medida representa para uma boa parcela dos que se valem e se beneficiam dessa prática. Aliás, já está arraigada na cultura do povo, desde o tempo de nossas avós, a entrega de leite de casa em casa.

Mas quem liga para a cultura e a tradição dos antigos? Afinal, nossa técnica universitária, capitalista e transgênica, para não falar da ignorância legislativa a serviço dos grandes monopólios que tomam leite de caixinha, acredita pia e cientificamente que está bem alimenta e prevenida de doenças.

Esquecem os legisladores (que aprovam leis para o judiciário dizer que se cumpra) que seus pais, e também um punhado de políticos empedernidos no poder, cresceram taludinhos tomando o leite, hoje chamado de clandestino, vindo de sítios e chácaras, trazidos nas simpáticas e saudosas carroças de nossa infância, cujo cavalo que a puxava conhecia melhor a localização das casas do que nós.

Ah! Como o tempo voa e lá se vão as lembranças de uma época onde tudo parecia mais limpo, mais belo e com menos perfídia. A assepsia dos tarros de latão, as embalagens de vidro, a leiteira de alumínio no portão. Hoje, ao que parece, tudo foi substituído pelas tais garrafas pet, polímero termoplástico que servem para os refrigerantes que matam, mas não serve para o leite que salva.

Em muitas cidades, dezenas de proprietários rurais vendem leite in natura no perímetro urbano de suas comunidades. A maioria deles tira o sustento de suas famílias a partir desta atividade, prática, aliás, que aprenderam com seus pais e avós. Hoje, seus filhos estão a lhe dizer que eles estão ultrapassados e a profissão está com os dias contados. Enquanto as sociedades mais desenvolvidas fazem o caminho inverso e redescobrem que os produtos naturais, não industrializados, são fontes de saúde, nossas pequenas comarcas ainda se encontram presas ao fascínio tardio da máquina.

A contribuição que os técnicos do IAGRO e das VISAs municipais estão dando ao fazer cumprir à risca as determinações vindas do Ministério Público, procedendo a apreensão do leite vendido irregularmente, entretanto, não resolve o problema, apenas reprime a venda e minimiza a prática. A gravidade do problema e o bom senso requerem mais que isso. Exige ações de inteligência, com planejamento e investimentos, sob pena de se estar acobertando a responsabilidade que é das administrações municipais de encontrar uma solução para o problema social e econômico que a proibição da venda do leite in natura acarreta para esse segmento via de regra excluído e economicamente explorado.

Há quem acredite que os municípios têm condições de enfrentar o problema de forma menos draconiana. A receita prescinde de instrumentos mínimos: a) um cadastramento dos pequenos proprietários que produzem e vendem leite in natura em pequena escala; b) um estudo de viabilidade e de custos para saber as vantagens de entregar ou não o leite in natura ao resfriador do laticínio ou colocá-lo à venda no varejo; c) um acompanhamento profissional de assistente social, extensionista rural e assessoria jurídica, a fim de, conforme o caso, fomentar a criação de uma cooperativa ou associação de produtores de leite; d) e previsão orçamentária de investimento público na aquisição de empacotadora de leite, de custo ínfimo, que poderá facilmente garantir a qualidade do leite distribuído sem afrontar a legislação.

O dorso da mão calejada passa sobre o rosto suado e cheio de rugas do velho retireiro que já não existe mais. E, eis, que de súbito, em meio as reminiscência do passado, vem-lhe à lembra as palavra do pai: --Vai, vai logo piá, vai apartá os bezerros que está na hora da ordenha..., sonha.


(*) é médico veterinário e advogado. E-mail: dutracarlito@uol.com.br

domingo, 20 de fevereiro de 2011

Alberto Kobayashi, adeus.

Foi como um soco na boca do estômago. A notícia da morte do amigo Koba pegou a todos de surpresa. Custo acreditar que um homem ainda jovem, 52 anos, profissional respeitado, e cidadão de bem, possa ter decidido, assim de repente, partir. Quando deveria ficar...

Que estranhos caminhos. Que dor para um pai e uma mãe suportar... Só por Deus.

Filho único, engenheiro elétrico e farmacêutico. Homem dedicado e brilhante, soube cativar amigos, não pelos títulos e patrimônio, mas pela humanidade e a convivência livre com os semelhantes, especialmente a juventude...

Particularmente, tinha uma dívida de gratidão para com esse homem. Há dez anos, me brindou com o projeto técnico da instalação elétrica de minha casa. E nada cobrou. Dei-lhe apenas uma caneta de presente.... Quanto sinto não ter-lhe dito o quão importante ele foi para mim.

Na condição de servidor público, foi companheiro e soube valorizar meu profissionalismo, num tempo onde a confiança ia além dos cargos, e éramos mais que chefe e peão (ele na Secretaria de Saúde e eu na Vigilância Sanitária).

Amigo Koba, Brasilândia teria te dado uma despedia à altura, porém a sorte assim não quis. Mesmo sem ir despedir-me de ti, leve de cabresto minha singela homenagem e prece. E de tantos outros que te amavam como a um irmão.

Continues dando alegria no Céu, em companhia de outros brasilandense que partiram, ainda ontem. Que Deus o abençoe, Maria o proteja, e descanse em paz.

dutracarlito@uol.com.br